segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Mas ficaria contando as horas (Proust)

"- Não poderia viver sem ti.
- Não, isso não - respondeu-me com voz alterada. - É preciso ter o coração mais forte. Pois então, que não seria de ti no dia em que eu viajasse? Pelo contrário, serás ajuizado e feliz.
- Sim, serei ajuizado se não fores mais que por alguns dias, mas ficaria contando as horas.
- E se eu me for por alguns meses... - só de ouvi-lo apertava-se-me o coração - ou por anos... ou por...?"

(Marcel Proust in: Em busca do tempo perdido vol. 2 - À sombra das raparigas em flor.Tradução de Mario Quintana. Ed. Globo, p. 365)

Mas essa não é a palavra correta.


“Charles era o mais forte. E o mais forte é sempre temido. “Melhor ser temido do que ser amado?” O melhor é ser temido e amado. Será que o temor e o amor podem existir juntos? Quase sempre.
Por que uma criança ama? Por medo do abandono, quando o alimento ainda é necessário. Ocorrerá o mesmo com o amor? Mas essa não é a palavra correta. Qual é a palavra – quando um corpo alimenta o outro?

(Josephine Hart in: Pecado. Ed. Círculo do Livro, p. 85)

consciência de que a vida havia sido criada para ser maravilhosa

"O ar recendia a flores, comida e cera de assoalho, e Juliet foi dominada por uma nova consciência, a consciência de que a vida havia sido criada para ser maravilhosa. Sentia que, em algum momento do passado, já tivera essa consciência, mas inexplicavelmente a esquecera."

(Rachel Eusk in: Arlington Park. Ed. Companhia das Letras, p. 21)

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Sonhei com o tempo que não passava nunca


“O tempo parou o tempo e o dia seguinte não chegava nunca. (...) Então, rezei. Rezei para qualquer coisa. Rezei para que o tempo passasse depressa. Para que a merda do tempo voasse e me transportasse para o próximo amanhecer, mas nada. Nada daquilo andar. Nada de o ponteiro se mexer. Nada. Passei a noite acordado. Passei a porra da noite acordado. Passei a noite delineando pensamentos, confabulando artimanhas, refletindo, cismando, meditando e sonhando. Passei a noite sonhando.
Sim. Também sonhei.
O pouco que dormi, sonhei. E sonhei não com Marina, mas com o tempo. Sonhei com o tempo que não passava nunca.”

(Ítalo Ogliari in: A volta. Editora 7 Letras, p. 30)

A falta que ama (Drummond)


Entre areia, sol e grama
o que se esquiva se dá,
enquanto a falta que ama
procura alguém que não há.

Está coberto de terra,
forrado de esquecimento.
Onde a vista mais se aferra,
a dália é toda cimento.

A transparência da hora
corrói ângulos obscuros:
cantiga que não implora
nem ri, patinando muros.

Já nem se escuta a poeira
que o gesto espalha no chão.
A vida conta-se inteira,
em letras de conclusão.

Por que é que revoa à toa
o pensamento, na luz?
E por que nunca se escoa
o tempo, chaga sem pus?

O inseto petrificado
na concha ardente do dia
une o tédio do passado
a uma futura energia.

No solo vira semente?
Vai tudo recomeçar?
É falta ou ele que sente
o sonho do verbo amar?


(Carlos Drummond de Andrade)

um desassossego sempre crescente e sempre igual (F. Pessoa)

Paula Rego
"Tudo em mim é a tendência para ser a seguir outra coisa; uma impaciência da alma consigo mesma, como com uma criança inoportuna; um desassossego sempre crescente e sempre igual. Tudo me interessa e nada me prende."

(Fernando Pessoa in: Livro do desassossego. Ed. Companhia de Bolso, p.49)

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Um sábado


“As cartas eram para ele como um sábado, um momento em que se sentia acolhido e seguro”.

(Tatiana Salem Levy in: A chave da casa. Ed. Record, p.132)

a gente compõe de corpo a corpo a última trama


O Chão é a cama

O Chão é a cama para o amor urgente,
O amor não espera ir para a cama.
Sobre o tapete no duro piso,
a gente compõe de corpo a corpo a última trama.
E para repousar do amor, vamos para a cama!

(Carlos Drummond de Andrade in: O Amor Natural)

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Talvez, quem sabe - Beckett II


Imagem: Vena Cavas
“As coisas talvez tenham se passado de maneira diferente, mas que importa a maneira pela qual as coisas se passam, desde que se passem?”

(Primeiro Amor, Samuel Beckett, p. 22, Ed. Nova Fronteira)

Clarice e a esperança


“A esperança era o meu pecado maior.”

(Clarice Lispector in: Os desastres de Sofia)

Era a tua lembrança que batia

Henry Payne
"Adornou o meu quarto a flor do cardo,
Perfumei-o de almiscar recendente;
Vesti-me com a purpura fulgente,
Ensaiando meus cantos, como um bardo;

Ungi as mãos e a face com o nardo
Crescido nos jardins do Oriente,
A receber com pompa, dignamente,
Mysteriosa visita a quem aguardo.

Mas que filha de reis, que anjo ou que fada
Era essa que assim a mim descia,
Do meu casebre á humida pousada?...

Nem princezas, nem fadas. Era, flor,
Era a tua lembrança que batia
Ás portas de ouro e luz do meu amor!"

(Antero de Quental in: Visita)

Acerca da dona adrenalina

"Bárbara gostava da adrenalina do desespero. Vivera dela até o momento em que a sua vida  desacelerara definitivamente."

(Inês Pedrosa in: Os íntimos. Ed. Alfaguara, p.110)

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

podemos de tempos a tempos reencontrar o ser que fomos (Proust)

“Ora, as lembranças de amor não abrem exceção às leis gerais da memória, regidas também estas pelas leis mais gerais do hábito. Como o hábito enfraquece tudo, o que melhor nos recorda uma criatura é justamente o que havíamos esquecido (porque era insignificante e assim lhe havíamos deixado toda a sua força). Eis por que a maior parte da nossa memória está fora de nós, numa viração de chuva, num cheiro de quarto fechado ou no cheiro de uma primeira labareda, em toda parte onde encontramos de nós mesmos o que a nossa inteligência desenhara, por não lhe achar utilidade, a última reserva do passado, a melhor, aquela que, quando todas as nossas lágrimas parecem estancadas, ainda sabe fazer-nos chorar. Fora de nós? Em nós, para melhor dizer, mas oculta a nossos próprios olhares, num esquecimento mais ou menos prolongado. Graças tão somente a esse olvido é que podemos de tempos a tempos reencontrar o ser que fomos, colocarmo-nos perante as coisas como o estava aquele ser, sofrer de novo porque não mais somos nós, mas ele, e porque ele amava o que nos é agora indiferente”.

(Marcel Proust in: Em busca do tempo perdido vol. 2 - À sombra das raparigas em flor.Tradução de Mario Quintana. Ed. Globo, p. 267)

Que vai pintar o céu com fogos de artifício


“E talvez ali mesmo eu tivesse decretado: é ela. Que vai pintar o céu com fogos de artifício. Que vai colocar os tapetes no quintal para pegar sol. Que vai encontrar um quintal onde colocar os tapetes e o sol.”

(Adriana Lisboa in: Um beijo de colombina. Ed. Rocco, p. 31)

raros instantes


“Um desses raros instantes, cada vez mais raros, cada vez mais breves, quando o desejo ainda não havia se dissipado, e se materializava em forma de promessas e olhares e excessos.”

(Carola Saavedra in: Toda terça. Ed. Companhia das Letras, p. 43)

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Como se gritasse as palavras que ele buscava, o sentido que não tinha

“Como se ele completasse o gesto que ela iniciava, o sonho que ela dormia. Sempre preferira os homens brutos. Mas ele a estarrecia com tanta doçura.
Ela também o espantava. O seu fraco sempre foram as mulheres delicadinhas. Mas ela o surpreendia com a sua intensidade e paixão. Como se gritasse as palavras que ele buscava, o sentido que não tinha. Como se iluminasse o valor de todas as coisas, coisas que ele antes nem percebia.”

(Claudia Lage in: A pequena morte e outras naturezas. Conto: A pequena morte. Ed. Record, p. 21)

seu isolamento trágico do mundo


“A solidão de Nelson Rodrigues, seu isolamento trágico do mundo que nos cercava me escaparam, e agora, que era tarde demais para um repórter, voltavam como um susto.”

(José Castello in: Inventário das sombras. Ed. Record, p.141 )

Meu reino por um ingresso para o camarote da Brahma na Marquês de Sapucaí

Foto: Divulgação, Columbia Pictures
Meninas, leiam isso

Quem sabe a Marquês de Sapucaí não seja tão ruim assim, hahahaha.

De modo que nunca se compreendeu ao certo... (Clarice Lispector)

“Mas eu sou uma chata que parece viver com medo de dizer as coisas claramente. Isso me lembra um personagem de Proust que era tão delicado, mas tão delicado, que para agradecer uma garrafa de caixas de vinho que recebera em presente em vez de agradecer simplesmente – achava mais “fino” falar em garrafas, ou falar de um modo geral de “vizinhos simpáticos” (fora um vizinho que lhe dera o presente) – de modo que o tal vizinho nunca entendeu que estavam agradecendo o vinho...

(Carta de Clarice Lispector para Tania Kaufmann. Berna, 05-10-1948 do livro: Correspondências Clarice Lispector, organizado por Teresa Montero, Ed. Rocco, p. 178)

como se ele jamais tivesse existido, sim, é isso, jamais, jamais (M. Duras)


“Não, a jovem não olhou mais para o menino, como se ele não existisse, como se nunca tivesse existido, como se ele fosse penalizado por ser amável ao ponto de ser maldito, como se ele jamais tivesse existido, sim, é isso, jamais, jamais, como se a própria ideia de sua existência nunca a houvesse aflorado, como se você não existisse. O menino retirou a mão, estancou, ele não compreendia quem ela era, quem ela havia se tornado.”

(Marguerite Duras in: O verão de 80. Ed. Record, p. 95)

Tudo o que é verdadeiramente grande, é inalcançável


"(...) e, como tudo o que é realizado, esterilizantes."

(Marcel Proust in: Em busca do tempo perdido vol. 2 - À sombra das raparigas em flor.Tradução de Mario Quintana. Ed. Globo, p. 293)

domingo, 20 de fevereiro de 2011

sempre quer ser - agora - sempre



es casi ley
los amores eternos
son los mas breves”

(Benedetti)

A relatividade do tempo


Robert Doisneau
 “O tempo parece rastejar, tempo de sonho, câmara lenta, pesadelo para uma criança de nove anos.”

(Erica Jong in: O vício da paixão. Ed. Círculo do Livro, p. 256)

sábado, 19 de fevereiro de 2011

"Literatura para quê?"

Sábado de manhã, entrei numa livraria com esta pergunta na cabeça. Logo descobri um livro que a tem como título: “Literatura para quê?”, tradução da aula inaugural de Antoine Compagnon no Collège de France, em 30/11/2006. O livrinho, de apenas 57 páginas e editado pela UFMG, põe palavras na angústia que me deixou esse tempo sem escrever (nem aqui, nem no caderno, nem em lugar nenhum). Literatura para que mesmo? Como pude escrever tanto? Será que devo guardar o que escrevo somente para mim? Alguém ainda se importa com o valor poético? Já existem tantos livros à venda, qual o sentido de publicar mais um?
Compagnon parte do princípio de que literatura e modernidade sempre viveram em conflito, para concluir que uma faz parte da outra. Por isso, apesar do espaço que vem perdendo, a literatura continuaria insubstituível: “Ela sofre concorrência em todos os seus usos e não detém o monopólio sobre nada, mas a humildade lhe convém e seus poderes continuam imensos; ela pode, portanto, ser abraçada sem hesitações e seu lugar na Cidade está assegurado. O exercício jamais fechado da leitura continua o lugar por excelência do aprendizado de si e do outro, descoberta não de uma personalidade fixa, mas de uma identidade obstinadamente em devenir”.
Para um escritor, perguntar sobre o sentido da literatura é perguntar sobre o sentido da vida. Não escrever, para nós, equivale a não viver. Talvez seja bom voltarmos a uma reflexão dessas de tempos em tempos. Rever assim nossas metas e ajustar a rota. Neste ajuste que ora faço, dou um passo importante. Chego finalmente a um projeto de pós-doc, quase um ano após a defesa da tese de doutorado. Nesta pesquisa, meus alunos das oficinas literárias terão um papel decisivo. Afinal, são eles que me animam a continuar.

Por Ana Letícia Leal

*Surrupiado daqui.

Das perguntas (Woody Allen)


“- Não sei. Achou que foi bom mesmo?
- Bom? Sim. Nunca me diverti tanto sem rir.”

(Do filme: Annie Hall, Woody Allen)

Para quem gosta de moda - 24/02 (quinta próxima) - na Fnac Barra (Rio de Janeiro)

A empresária Gabriela Fiúza é a mais querida-simpática-fofa-dona-de-loja-bacana do Rio de Janeiro (lojas, ela tem dois brechós: um adulto e outro infantil).
E eu estou curiosa para ler os guias. 
Vale a pena aparecer lá na Fnac.

como aqueles personagens de Tchekhov


“(...) é um homem honesto e bem intencionado, cheio de melancolia, como aqueles personagens de Tchekhov tão cheios de virtudes, que não conseguem nada na vida.”

(Orhan Pamuk in: Neve. Ed. Companhia das Letras, p. 13)

sim, eu ia a muitas festas, mas a vida sem você era apenas um pedaço de angústia


“LUÍSA – (...) eu chegava à redação depois de dois dias sem te ver, à espera de encontrar em você a mesma saudade, a mesma alegria de me rever... mas você tão altivo, Sérgio! Você me olhava com a expressão de quem sobrevivera magnificamente à minha ausência... e, então, se você me perguntava como tinha sido o meu fim de semana, eu respondia não para te humilhar, mas para mostrar que eu, também, podia me divertir sem você e que, também, podia sobreviver à tua ausência... mas o que eu queria ouvir, nas manhãs de segunda-feira, você nunca disse: eu queria que você dissesse “foi penoso o meu fim de semana, senti muita saudade”... porque o meu fim de semana tinha sido penoso e eu tinha morrido de saudade... você fala das festas... sim, eu ia a muitas festas, mas a vida sem você era apenas um pedaço de angústia... e se eu não podia estar com você, queria pelo menos ter você no meu pensamento o tempo todo... (...) Você jamais disse as frases que eu tinha escrito para você, nada era como eu tinha imaginado...

(Maria Adelaide Amaral in: Melhor teatro. Ed. Global, p. 226-227)

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Alguma coisa sempre me escapa

"Desentranhar a poesia deste mundo. Eu bem que gostaria. Alguma coisa sempre me escapa, amigo Manuel Bandeira, meu irmão. Alguma coisa sempre me escapa. Os amores, os chinelos."

(Adriana Lisboa in: Um beijo de colombina. Ed. Rocco, p. 66)

Nise da Silveira no teatro - RJ


Nise da Silveira – Senhora das Imagens
Peça conta a história da doutora que mudou os rumos da psiquiatria no Brasil
 
Reunindo teatro, cinema, fotografia, música e dança, o drama Nise da Silveira – Senhora das Imagens relata a história de uma das mulheres brasileiras mais importantes do século XX. Precursora de métodos alternativos de tratamento psiquiátrico, Dra. Nise aboliu os usuais choques elétricos, passando a utilizar terapias que abordavam pintura, escultura e modelagem.

Aluna e discípula de Carl Jung (1875-1961), ela revolucionou o tratamento de doentes mentais. Com todo o material produzido nos ateliês de terapêutica ocupacional, fundou o Museu de Imagens do Inconsciente, no bairro do Engenho de Dentro, no Rio.

A ficha técnica da produção conta com colaboradores de peso como Ferreira Gullar (biógrafo de Nise) e o doutor em literatura Marco Lucchesi, na elaboração do texto. A coreografia é assinada pela bailarina Ana Botafogo e a trilha sonora original é executada ao vivo pelo pianista João Carlos Assis Brasil.

serviço

Temporada prorrogada até 20 de março, agora de quarta a domingo às 19 horas. As sessões de domingo iniciam no dia 27/02.

Local:
Caixa Cultural - Teatro de Arena

Informações:
Avenida Almirante Barroso, 25, Centro || Tel: 2544-4080 || R$ 30,00 / R$ 15,00 || www.caixacultural.com.br

em olhá-la novamente, em aumentar seu olhar com uma visão suplementar


Contentava-se em olhar para Suzanne com olhos transtornados, em olhá-la novamente, em aumentar seu olhar com uma visão suplementar, como as pessoas habitualmente fazem quando a paixão as sufoca.

(Marguerite Duras in: Barragem contra o Pacífico. Ed. ARX, p. 67)

Invenção como sobrevivência


“Agora vamos ter que inventar a fantasia para poder sobreviver à fenda.”

(Lidia Aratangy)

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Tão simples quanto inatingível


“Muitas vezes, quando isso acontecia, nos vimos nus e sozinhos, pensando na nossa solidão, em nossos fantasmas, em nossos sonhos abortados. No fundo era muito simples o que queríamos. Tão simples quanto inatingível. E quando despertávamos daqueles pensamentos amargos, éramos quase sempre gentis um com o outro”.

(Maria Adelaide Amaral in: Luísa (Quase uma história de amor). Ed. Globo, p. 119)

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Resenha nova (minha) lá no Amálgama: "A Psicose"

Tem resenha nova (minha) lá no Amálgama.
É deste livro da imagem.
Passem lá.

Sobre abalos sísmicos (Proust)

"O amor provoca assim verdadeiras convulsões geológicas do pensamento. No do sr. de Charlus que, ainda dias antes, se assemelhava a uma planície tão uniforme que, na maior distância, não se poderia vislumbrar uma só idéia ao nível do solo, se havia bruscamente erguido, duro como pedra, um maciço de montanhas, mas de montanhas que também fossem esculpidas, como se algum estatuário, em vez de transportar o mármore, o tivesse cinzelado no local e onde se contorciam, em grupos gigantescos e titânicos, o Furor, o Ciúme, a Curiosidade, a Inveja, o Ódio, o Sofrimento, o Orgulho, o Medo e o Amor".

(Proust in "Sodoma e Gomorra", p. 376)

Ouça

Ah, sim, deveria


“Os esquimós tem 52 palavras para designar neve porque ela é muito importante para eles; deveria haver outras tantas para o amor.” [Margaret Atwood]

(Ruy Castro in: O amor de mau humor (edição e tradução) – Uma antologia de frases venenosas sobre a relação homem/mulher. Ed. Companhia das Letras)

“Sou do tamanho do que vejo!” (Fernando Pessoa)

“Mas recolho-me a abrando. “Sou do tamanho do que vejo!” E a frase fica sendo-me a alma inteira, encosto a ela todas as emoções que sinto, e sobre mim, por dentro, como sobre a cidade por fora, cai a frase indecifrável do luar duro que começa largo o anoitecer.”

(Fernando Pessoa in: Livro do desassossego. Ed. Companhia de Bolso, p.77)

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

esconde algum mistério imponderável


“Assim, por exemplo, a fantasia masculina fundamental relativa à mulher não é a sua aparência sedutora, mas a ideia se que essa aparência deslumbrante esconde algum mistério imponderável.”

(Slavoj Žižek in: Como ler Lacan. Ed. Zahar, p. 140)

Que tipo de piscina terá embaixo desse trampolim?*


“Ai do acaso, se não ficar do meu lado.”

(Paulo Leminski)

*O título é de uma música do Moska chamada "Trampolim"

sensação de vento no rosto


“- Você está diferente.
- Estou – ela concordou. – Tenho muita saudade de mim mesma, da sensação de vento no rosto, aquela sensação que só a paixão produz.”
                                                                                      
(Maria Adelaide Amaral in: Aos meus amigos. Ed. Siciliano, p. 52)

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Para quem sofre com "encosto virtual": twitter do paranóico

Depois dos "encostos virtuais" (ou fakes e anônimos e afins), achei esta imagem perfeita!
À lá Hitchcock.

É de um blog que eu adoro, o da talentosíssima Laura Ballés - colega de Amálgama. 

Que aconteça algo bem bonito para vocês



Meu coração, sereno como uma bomba relógio


“Só que quanto mais eu fugia, mais eu corria atrás dela. Por alguma razão maluca, ou absoluta falta de razão, eu me senti perdido. Pois é assim que se define e ação de quem não sabe onde vai e nem o que faz. Meu coração, sereno como uma bomba relógio, tomado por profundas sensações, algumas sem nome, como aquele calafrio crispado da montanha russa, um segundo antes de despencar no abismo, tentei prestar atenção em alguma outra coisa, não havia nada além de desordem no meu cérebro”.

(Do filme: Onde andará Dulce Veiga?)

vê que o amor pode ser dito inversamente à sua potência

“Nos olhos do menino o estupor porque ela não olha mais para nada, porque sua mão não se fechou sobre a dele, não segurou, como se não acontecesse nada. No quarto escuro nada mais aconteceu. Tudo seria possível pela chegada de uma só palavra que eu não sei escrever e que diria da inteligência indefinidamente aproximativa desse desespero. O menino vê que está além de suas forças compreender isso, ele a olha, vê que o amor pode ser dito inversamente à sua potência, retirar-se de si mesmo e se calar mais violentamente que se dissesse.”

(Marguerite Duras in: O verão de 80. Ed. Record, p. 95-96)

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Mentira dos relógios e dos cronômetros: o tempo não é lógico.

"Não, o tempo não avança em linha reta. Mentira dos relógios e dos cronômetros: o tempo não é lógico.
(...) O relógio se esforça em deter o que não se detém. Enquanto isso, o romance de Barrie mostra como é precário nosso desejo de estabilidade. A ficção demonstra que habitamos, ao mesmo tempo, vários mundos. O que pode um relógio contra a vida?
(...) À noite, nas florestas escuras, os pastores sofrem de medos súbitos, fogem de fantasmas, sentem calafrios. Ficções malignas desestabilizam seu presente. "Peter Pan" nos leva a ver, contudo, que o sonho pode persistir sem que se transforme em pesadelo. Muitos adultos sufocam a fantasia, outros a matam. A luta do herói de Barrie para preservá-la não fala do medo, mas da esperança. De alguma forma, "Peter Pan" sobreviveu em José Saramago. Quando, preparando-se para a morte, ele deu as mãos ao menino que foi, a sombra de Peter Pan sobre ele se derramava."

(José Castello in: Peter Pan em Lanzarote. 12-02-11, Jornal o Globo, Caderno Prosa & Verso, p. 4)

Escreve a história dessa dor e eu te livro dela. É uma troca.

"A janela continuou fechada. Mas a voz falou:
- Eu te livro desse amor, desse peso.
- O quê?
- Esse amor que você está sofrendo, essa vontade que você está sentindo de morrer: eu te livro disso.
- De que jeito?!
- Quando a história estiver pronta você vai ver.
- História? que história?
A voz falou mais baixo:
- Escreve a história dessa dor e eu te livro dela. É uma troca: eu te prometo."

(Lygia Bojunga in: Tchau. Conto: A troca e a tarefa. Ed. AGIR, p. 56)

Desejo e ciência


“É como se os cavalos fossem o Desejo e a carroça puxada por eles a ciência. (...) se os cavalos se separam dela, ela não mais se moverá.”

(Gonçalo M. Tavares in: Breves notas. Ed. UFSC/Editora da Casa)

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Acredito em tijolos, e acredito em cacos de tijolo, nas sobras de um tijolo específico destinado a determinado passante que, sem propósito ou querer, acerta os outros à sua volta


"Millôr diz que viver é desenhar sem borracha. Diz também que é como atravessar uma chuva de tijolos: a gente escapa da maioria deles, mas às vezes um acerta um ombro, às vezes pega meio de lado, às vezes parte um joelho. As marcas das tijoladas vão se acumulando, dentro e fora, até aquele tijolo que acerta em cheio. Gosto dessa metáfora. Acredito em tijolos, e acredito em cacos de tijolo, nas sobras de um tijolo específico destinado a determinado passante que, sem propósito ou querer, acerta os outros à sua volta, aquilo que em linguagem de guerra os angloparlantes chamam de collateral damage.
Não estou simpatizando com 2011. A quantidade de tijolos está acima do suportável."
 
(Cora Ronai no Jornal O Globo – 10-02-11)

Ou às vezes por nenhuma razão (Hitchcock)

"- Acho que o maior mal da humanidade foi causado pelos poetas.
- Os poetas são meio bobos, na maioria. Mas não são perversos.
- Mas enchem a cabeça das pessoas com ilusões sobre amor e escrevem sobre ele como se fosse uma orquestra regida por anjos.
- O que não é verdade.
- É claro que não. As pessoas se apaixonam porque reagem às cores dos cabelos ou o timbre da voz, ou a gestos que as fazem lembrar de alguém.
- Ou às vezes por nenhuma razão.
- Falar sobre o amor é uma coisa e conhecê-lo é outra. As pessoas pensam que os beijos são líricos e os abraços, dramas de Shakespeare.
- E quando percebem que não são assim, ficam doentes e procuram os analistas.
- Isso mesmo.
- Doutora, está sofrendo de algum mal.
- Como?"

(Do filme: Spellbound. Direção de Hitchcock)