sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

difícil análise

(...) uma espécie de admiração confusa como, diante de grandes obras de arte ou maravilhas da natureza, ficamos a princípio atônitos e incapazes de análise.

André Gide in: Isabelle. Ed. Nova Fronteira, p. 29.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

vá logo

Menino, se você não é comunista, vá sendo logo, que é para deixar de ser depressa. Eu já fui e já larguei.

Carlos Drummond De Andrade - aconselhando o jovem que lhe cobrou uma "posição".

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

dos caminhos

(...) há sempre um dia que nos perguntamos
fui eu quem me fez assim ou me fizeram?
e a resposta importa pouco, importa nada;
seja qual for, não voltará jamais o que perdeste
em alguma esquina do caminho, não sabes onde,
não sabemos como, e mesmo o choro então é pouco para
[tua dor

E ainda que compres rosas ou vás ao cinema ou cantes
uma canção qualquer, o que persiste é a morte
com seu roteiro de vermes e distâncias.

no dia seguinte ao dia em que não morremos,
iniciados na tarefa de tecer o inútil
trocamos os lençóis, lavamos o rosto, arrumamos a casa e
[partimos para a rua
sem que ninguém perceba o epitáfio sobre a fronte.

Caio Fernando Abreu in: Poesias nunca publicadas de Caio Fernando Abreu. Poema: Invernal. Record, p. 96-97.

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

o pessimista

É melhor ser pessimista que otimista. É porque o pessimista fica feliz quando acerta e quando erra.

Millôr Fernandes

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

das dores

...à mãe cabia ensinar à filha que aquela dor não era maior do que qualquer outra, sabido que o banal da vida era assim: fazer o suficiente com aquilo que a dor faz de você.

Estevão Azevedo​ in: Tempo de espalhar pedras. Cosac & Naify, p. 230.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

Das pipas

Quanto a Huong e Lihn, que conheciam bem essa história (a partir da fase náutica), suas pequenas almas também não pareciam estar ali, presentes, quando seus pés pisavam as calçadas das novas cidades pelas quais passavam. Mesmo quando aprendiam palavras do novo idioma e decifravam os costumes esquisitos de seu novo país.
Suas almas não estavam grudadas no corpo, Alex pensava. Pairavam em algum outro lugar, como se fossem pipas que elas empinavam e que flutuavam lá no alto, onde havia mais ar puro e menos todas as outras coisas.

Adriana Lisboa in: Hanói. Ed. Alfaguara, p. 46-47.

Imagem: Portinari


quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

outro jeito de falar

(...) que vai ver estava com medo do que podia sair da minha boca se me deixasse falar, esse jeito de conversar comigo a duas vozes, a dela perguntando e a dela mesmo respondendo por mim, eu até achando aquilo cômodo, calada, sem precisar nem mentir nem desagradar, nem concordar nem discordar...

Maria Valéria Rezende in: Quarenta Dias. Ed. Alfagua, p. 74.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

do amor

Os homens amam com os olhos, e as mulheres com os ouvidos.

Zsa Zsa Gabor

domingo, 10 de janeiro de 2016

e se

“E, se um homem pode dormir salgado de mar e pela manhã se descobrir guardador de rebanho, e se um outro acordou inseto na mente de um escritor, e se dos desenhos de uma pintora floresceu um abaporu, e se numa tela imóvel irromperam formigas e um cão andaluz, e se campos e ramos e rosas pariram territórios imaginários, tu podes amanhecer tristeza, entardecer esperança e anoitecer sol.”

João Anzanello Carrascoza in: Caderno de um ausente. Cosac Naify

sábado, 9 de janeiro de 2016

dos amigos

No jogo de bilhar da amizade, a prerrogativa fora minha: eu o tinha sorteado para ser a eterna bola da vez. Que assumisse a condição.

Silviano Santiago in: Mil rosas roubadas. Companhia das Letras, p. 27.


quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

da leitura

A leitura de Proust, de Blanchot, de Kafka, de Artaud não me deu vontade de escrever sobre estes autores (nem sequer, acrescento, como eles), mas sim de escrever. Nessa perspectiva, a leitura é verdadeiramente uma produção: não já de imagens interiores, de projecções, de fantasmas, mas, à letra, de trabalho: o produto (consumido) é transformado em produção, em promessa, em desejo de produção, e a cadeia engendra, até o infinito.

Roland Barthes in: O rumor da língua. Edições 70, p. 36.

terça-feira, 5 de janeiro de 2016

da ironia

A ironia irrita. Não porque ela zombe ou ataque, mas porque nos priva de certezas, desvendando o mundo com ambiguidade.

Milan Kundera

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

da autobiografia

Toda arte é autobiográfica: a pérola é a autobiografia da ostra.

Federico Fellini