quarta-feira, 12 de maio de 2010
Diógenes: carne sangrenta
Nascido em Sínope em 444 antes de Cristo, e discípulo de Antístenes, o grego Diógenes Laércio foi o fundador da filosofia cínica. Segundo Michel Onfray, autor de O ventre dos filósofos, a exigência do cinismo é submeter o cotidiano a uma forma improvisada, porém sóbria e pura, livre das escórias e da afetação que são parentes da civilização.
carnecrua.jpgO desejo cínico é sabotar a confiança nos ideais que são também os princípios da ilusão: o sagrado, a convenção, o hábito, a passividade. O cínico prega o prazer simples. Chamado de filósofo do barril, Diógenes fará um uso pedagógico dos alimentos. Seu projeto é a volta a uma selvageria primária, sendo a alimentação marcada por este desejo.
“Ao cozido consensual da instituição nutritiva, Diógenes opõe o niilismo alimentar no mais alto grau, marcado principalmente pela recusa do fogo, de Prometeu, como símbolo da civilização. O primeiro princípio da dietética cínica é o cru”. (ONFRAY, p. 31)
Enquanto os outros consomem carne cozida, Diógenes quer carne sangrenta. Além disso, ele inclui também o vegetarianismo prático. O filósofo, segundo colegas da época, é retratado como um pacato colhedor de figos, raízes e frutas, e bebe água fresca das nascentes. Diógenes dizia querer escolher o alimento que poderia encontrar com mais facilidade.
De acordo com Onfrey, nenhuma existência chega à beleza sem uma morte à altura. Uma das versões da morte de Diógenes – há mais de uma – diz respeito a um polvo cru. O filósofo ousou comer um polvo cru para rejeitar a preparação das carnes cozidas. Sendo observado por muitos homens, Diógenes envolveu-se na capa do polvo e disse, dramaticamente: “É por vocês que arrisco minha vida, que corro este perigo”. E assim, morreu.
A alimentação para Diógenes teve a função de reivindicar o natural: ela expressa a recusa de um mundo, ao mesmo tempo que mostra o desejo de um outro, o da simplicidade. O polvo e o filósofo ilustraram como não pode haver dietética inocente.
Fonte: O ventre dos filósofos – crítica da razão dietética, Michel Onfray, Ed, Rocco, 1990.
Texto: Vanessa Souza
Publicado originalmente em: http://www.informativomalagueta.com.br/edicao.asp
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"nenhuma existência chega à beleza sem uma morte à altura."
ResponderExcluirpor que razão a paroxização do ser acaba por se confundir com a sua destruição... invariavelmente?...
um beijinho!
ler isto na semana em que decidi me tornar vegetariana é um alento!
ResponderExcluircaral***
ResponderExcluirnão o conhecia ainda.
muito bom, muito bom.
mais uma estória para minha lista de conhecimentos.
ResponderExcluirmuito bom. Eu não conhecia
Minha querida amiga, que saudade enorme!
ResponderExcluirEu li a entrevista com o Felipe Pena no Amálgama! Muito legal. Quero ler em breve.
Como estão as coisas? Por via das dúvidas, me mande um e-mail para atualização ahahha
Beijos!
Seu blog de certo modo me da prejuízo...sempre quero comprar algum livro...rsrsr
ResponderExcluirPreciso pensar e digerir...o polvo.
ResponderExcluirtentáculos pulsando a morte! coitado do polvo rs
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