sábado, 12 de dezembro de 2009

Almodóvar


Por Vanessa Souza

Caminho às cegas

Começo com um ato falho. Comentei com o editor do Amálgama que ia assistir “Amores Partidos”, e perguntei se ele queria um escrito sobre o filme. O último filme do Almodóvar chama-se Abraços Partidos, e não “Amores”. Enfim, é tudo com A mesmo. Pequeno A. Objeto causa de desejo para Lacan. A de Almodóvar.

Em Los Abrazos Rotos, o cineasta Harry Caine (Lluís Homar) é o protagonista do filme, uma invenção de si mesmo, já que na verdade – e quem detém a verdade? – ele se chama Mateo Blanco. Ou se chamava. Harry Caine também é o nome que Almodóvar escolheu, certa vez, em um momento que desejava desistir de ser Almodóvar. Ideia que não se realizou, já que, segundo o que o diretor espanhol disse em Cannes este ano: “Ninguém escapa de si mesmo”. Hilda Hilst poderia ter dito o mesmo para Almodóvar, em palavras similares: “Tu não te moves de ti”. Sim, Almodóvar, nem nós…

Antes de chegar ao cinema, não li uma linha sobre o filme. Como de costume. Tento não me influenciar com as críticas antes de assistir a um filme. Só o nome do diretor, os atores, a sinopse. Contudo, sendo Almodóvar um dos meus diretores favoritos – assisti tudo dele! –, já chego contaminada até não poder mais.

A paixão entre Mateo Blanco e a atriz Lena (Penélope Cruz), que surge no set de filmagens de “Chicas y Maletas”, é o ponto de partida do filme. Partida, princípio e fim. Catorze anos depois do fim do romance, Mateo, após um acidente de carro e cego, ainda morre de amores pela bela atriz. Só deixa a história em um canto obscuro, tapete empoeirado, guardado em alguma gaveta que ele possui as chaves. Conversando com Diego, filho de sua produtora, a gaveta é aberta. E a história do cineasta e de Lena acerta em cheio, nocauteia o espectador. Entre taquicardia, suspiros longos e uma inquietação que é um abismo, quem, voyeur, assiste do outro lado da tela, fica de-li-ci-o-sa-men-te incomodado com as imagens – e com os diálogos. A urgência dos amantes é dolorosa.

“O primeiro encontro só serviu para descobrir que a presença dela me incomodava”, conta Mateo, para Diego, com nostalgia absurda.

Uma das cenas mais belas do filme, em minha opinião, é quando um vídeo com o último momento do casal junto é projetado em uma tela. O cinema dentro do cinema. Mateo, já cego, se aproxima e tateia com as mãos – e que belas mãos! – o rosto de Lena, rememorando aquele momento, congelando-o, guardando-o para os dias cinzas e chuvosos.

Sim, a película ainda tem atuações brilhantes, grande enredo, suspense, takes incríveis, diálogos inteligentes, emoção… De tudo isso, fico com Lena e Mateo. Uma história breve e impactante. Tirada de uma gaveta, chaveada. Um romance abruptamente interrompido. Concluo com palavras do protagonista. “Os filmes têm que ser terminados, ainda que sejam às cegas”. E existe outra forma de atravessar o caminho do desejo, que não seja de olhos bem fechados?

Publicado em: http://www.amalgama.blog.br/12/2009/caminho-as-cegas/#more-958

2 comentários:

  1. oi tia van!

    não consegui escapar... rs! e tive que criar o fórum em YuBliss à partir do "ninguém escapa de si mesmo".

    http://www.yubliss.com/forum/337/

    bj,

    chico.

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  2. ahhh meu querido Almodóvar.

    amo amo =]
    esta semana vou ao cine assistir esse.
    estou curiossímaaaaa ^^'

    vou deixar para lê seu texto depois que vê a "película" como dizem os mocinhos de lá, rs.

    abraços querida,
    e obrigada pela visita =)

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