quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

nos refugiamos no futuro para escapar do sofrimento - M. Kundera

"Muitas vezes nos refugiamos no futuro para escapar do sofrimento. Imaginamos uma linha na pista do tempo, e pensamos que a partir dessa linha o sofrimento presente deixará de existir. Mas Tereza não via essa linha diante de si. Só podia encontrar consolo olhando para trás."

(Milan Kundera in: A insustentável leveza do ser)

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

a visão desse falso paraíso - Lúcio Cardoso

"Menos do que as palavras despendidas, o que parecia abatê-la mais era a visão desse falso paraíso que evocava."

(Lúcio Cardoso in: Crônica da casa assassinada)

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

o avesso

"Canto de sereia às avessas convencendo Ulisses de que o mar secou..."

(Evandro Affonso Ferreira in: Minha mãe se matou sem dizer adeus. Ed. Record, p. 46)

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Se não há coragem, não se entre

"O coração tem que se apresentar diante do nada sozinho e sozinho bater alto nas trevas. Só se sente nos ouvidos o próprio coração. Quando este se apresenta todo nu, nem é comunicação, é sbmissão. Pois nós não fomos feitos senão para o pequeno silêncio. Se não há coragem, não se entre."

(Clarice Lispector in: A descoberta do mundo, p. 130)

sábado, 25 de fevereiro de 2012

dos guardados - Caio F.

"Nunca pertenci àquele tipo histérico de escritor que rasga e joga fora. Ao contrário, guardo sempre versões de um texto, da frase rabiscada em guardanapo de bar à impressão no computador. Será falta de rigor? Pouco me importa."

(Caio F.)

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

tantos dias - J. Joyce

"Cada vida é muitos dias, dia após dia. Andamos através de nós mesmos, encontrando-nos com ladrões, fantasmas, velhos, jovens, esposas, viúvas, irmãos apaixonados, mas sempre encontrando-nos com nós mesmos."

(James Joyce in: Ulysses)

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

é sempre assim? - T. Salem Levy

" - Você não tem medo de que alguma coisa ruim aconteça?
- E por que aconteceria?
- Não é sempre assim: depois da alegria, a dor?"

(Tatiana Salem Levy in: Dois rios. Ed. Record, p. 73) 

sentir falta - Claudia Nina

"Mas sentir falta não é amar. Sentir falta é o mesmo que sentir saudade. Amar a gente ama mesmo a distância, mesmo sem sentir falta".

(Claudia Nina in: Esquecer-te de mim. Ed. Babel, p. 105)

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

da leitura - Proust

"Mas lêem-se os jornais como se ama, com uma venda nos olhos. Ouvem-se as doces expressões do redator-chefe como as de um amante. Pode ser derrotado e feliz quem se julga, não vencido, mas vencedor."

(Proust in: O tempo redescoberto. Tradução de Lúcia Miguel Pereira. Ed. Globo, p. 54)

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

De um modo complicado, isso era verdade

"Com frequência mamãe me dizia que não havia nenhum prazer em ser mãe, porque as crianças gostavam de atormentar. E, de um modo complicado, isso era verdade. Gostávamos do que as atormentava."

(Harold Brodkey in: Quatro histórias ao modo quase clássico. Ed. Imago, p. 71)

da necessidade

"- Eu preciso dos seus cabelos dourados, dos seus olhos fascinantes, seu sorriso encantador, seus lindos braços, sua forma divina.
- Espera um minuto! Isto é uma proposta ou você está fazendo um inventário?"

(Do filme: Uma dama de outro mundo)

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Esquecer-te de mim - concurso cultural

O blog "Vem cá Luísa, me dá tua mão", em parceria com a escritora Claudia Nina - autora do recém lançado "Esquecer-te de mim" (Eb. Babel) - tem um desafio aos leitores.

Responda: O que significa para você o título "Esquecer-te de mim"?

A melhor resposta vai ganhar um livro "Esquecer-te de mim", autografado pela autora.

Algumas regrinhas:
1) Além da resposta, é preciso curtir as páginas do "Esquecer-te de mim" e do “Vem cá Luísa..." no Facebook. Quem não tem perfil no Facebook, precisa ser seguidor do “Vem cá Luísa...”
2) A resposta precisa ter no máximo 400 caracteres com espaço.
3) A promoção começa hoje (31/01) e a resposta escolhida será divulgada em 01 de março de 2012.
4) As respostas devem ser enviadas para o e-mail vanessa.sza@bol.com.br com o título de e-mail "Esquecer-te de mim". Elas devem ser escritas no corpo do e-mail.
5) Os participantes devem residir no Brasil

das palavras recusadas - Lúcio Cardoso


 "Não sabia o que devia lhe dizer - uma palavra vinha e a recusava, outra nascia à flor dos lábios e desaparecia diante da desesperada fixidez daquelas pupilas."

(Lúcio Cardoso in: A luz no subsolo. Ed. Brasiliense, p. 38)

cheia de vida e pavorosamente morta ao mesmo tempo

Edie Sedgwick
"Ela era incrivelmente cheia de vida e pavorosamente morta ao mesmo tempo. E eu queria, por várias razões, fazê-la ressurgir dos mortos".

(Harold Brodkey in: Quatro histórias ao modo quase clássico. Ed. Imago, p. 24)

domingo, 19 de fevereiro de 2012

nem tão - Caio F.

"- Um dia tu vais compreender que não existe nenhuma pessoa completamente má, nenhuma pessoa completamente boa. Tu vais ver que todos nós somos apenas humanos. E sofrerás muito quando resolveres dizer só aquilo que pensas e fazer só aquilo que gostas. Aí, sim, todos te virarão as coisas e te chamarão mau por não quereres entrar na ciranda deles, compreender?"

(Caio F. in: Limite branco. Ed. Siciliano, p. 25)

mergulhado nessa distância que eu não conhecia - Lúcio Cardoso

"Pensei em dizer alguma coisa, em retê-la ainda, mas vi que seria completamente inútil: ela não me vira, não me reconhecera senão pelo espaço de um minuto, e já havia se distanciado novamente, e mergulhado nessa distância que eu não conhecia, e que brilhava em seus olhos como a lembrança de um mundo submerso."

(Lúcio Cardoso in: Crônica da casa assassinada. Ed. Record, p. 228)

Da cura do romantismo - Proust

"Aliás, se estava um pouco tranquilizado, não me sentia feliz. A perda de toda bússola, de toda direção, que caracteriza a espera, ainda persiste, após a chegada do ente esperado, e, substituindo em nós a calma em que imaginávamos com tanto prazer a sua chegada, impede-nos de sentir o mínimo prazer que seja. Albertine estava ali, meus nervos, destroçados, continuando a sua agitação, esperavam-na ainda. (...) Ficaríamos para sempre curados do romantismo se, para pensar naquela a quem amamos, procurássemos ser aquele que seremos quando não mais a amamos."

(Proust in: Em busca do tempo perdido vol. 5 - A Fugitiva. Tradução de Carlos Drummond de Andrade. Ed. Globo, p.113)

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Das coisas cruéis

"Era cruel que ela existisse e não fosse minha".

(Harold Brodkey in: Quatro histórias ao modo quase clássico. Ed. Imago, p. 8)

Ela era César e governava o mundo e não era ninguém

"Ela era bonita, assustada, vazia, tímida, só, ferida e invulnerável (como um aleijado: o que mais se pode fazer com um aleijado?). Ela era César e governava o mundo, e era não-César, e não era ninguém."

(Harold Brodkey in: Quatro histórias ao modo quase clássico. Ed. Imago, p. 13)

Da dificuldade - Claudia Nina

"A coisa mais difícil a se fazer quando se decide começar vida nova é levantar a ponta do dedo mindinho".

(Claudia Nina in: Esquecer-te de mim. Ed. Babel, p. 89)

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Entrevista com a escritora Claudia Nina

Lá no Amálgama:

http://www.amalgama.blog.br/02/2012/entrevista-com-claudia-nina/

Da solidão de escrever

"Nas cidades, nas aldeias, em toda parte, os escritores são pessoas sós. Em toda parte, e sempre, foram assim.".

(Marguerite Duras in: Escrever. Ed. Rocco, p. 45)

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Das tragédias e novelas - Philiph Roth

"Passaram a vida só lendo tragédia grega e coisa parecida, e acabam transformando a vida numa novela mexicana."

(Philip Roth in: A marca humana. Ed. Companhia das Letras, p. 225)

Da vertigem - Milan Kundera

Into the wild
"Tinha vontade de destruir brutalmente todo o passado... (...) Era a vertigem. Um atordoamento, um insuportável desejo de cair.
Eu poderia dizer que a vertigem é a embriaguez causada pela nossa própria fraqueza. Temos consciência da nossa própria fraqueza mas não queremos resistit a ela e nos abandonar. Embriagamo-nos com nossa própria fraqueza, queremos ser mais fracos ainda, queremos desabar em plena rua, à vista de todos, queremos estar no chão, ainda mais baixo que o chão."

(Milan Kundera in: A insustentável leveza do ser. Ed. Record, p. 81-82)

Da memória involuntária - Proust

"Minha memória perdera o amor de Albertine, mas parece existir uma memória involuntária dos membros, pálida e estéril imitação da outra, que lhe sobrevive, como certos animais ou vegetais ininteligentes vivem mais do que o homem. As pernas, os braços, estão cheios de lembranças embotadas."

(Proust in: O tempo redescoberto. Tradução de Lúcia Miguel Pereira. Ed. Globo, p. 12)

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Da memória - Inês Pedrosa

"Não se consegue amar completamente senão na memória, Sebastião. As histórias que sonhamos para as pessoas amadas flutuam na neblina dos dias muito quentes, como mentiras leves tocadas pelo peso da verdade."

(Inês Pedrosa in: A eternidade e o desejo. Ed. Alfaguara, p. 53)

O pensamento é diferente - Adriana Lisboa


"Não, eu não queria ver nada disso. E não, eu não queria pensar em nada disso, mas infelizmente com o pensamento é diferente, a liberdade que ele tem tolhe a nossa, o pensamento faz o que quer."

(Adriana Lisboa in: Azul-corvo. Ed. Rocco, p. 198)

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Começa-se a ler muito antes de saber localizar literaturas

"Os livros contraem-se assim irremediavelmente, tragicamente. Não importa por onde comece a contaminação; há um cheiro, um restolhar de papel, e depois a gulodice alastra. Começa-se a ler muito antes de saber localizar literaturas, nomes, gêneros, e há nesse estrebuchar inicial qualquer coisa de sublime que definitivamente se perde quando crescemos e aprendemos a selecionar o bom e o mau. Lembro-me de vaguear inebriada pelas prateleiras das livrarias, folheando as prateleiras de baixo à procura do livro que eu queria e não sabia qual era, revoltada com a ideia de que talvez o livro estivesse nas prateleiras de cima. Lembro-me dos dias em que um título, uma frase, me faziam trazer para casa ratoeiras onde os dedos se entalavam e os olhos esmoreciam."

(Inês Pedrosa in: A instrução dos amantes. Publicações Dom Quixote, p. 132-133)

Do sentido - T. Salem Levy

"Era natural estar perto de você, tudo fazia sentido, e eu não buscava sentido algum. Porque a gente só busca o sentido quando ele deixa de existir."

(Tatiana Salem Levy in: Dois rios. Ed. Record, p. 170) 

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

dos simulacros - J.-D.Nasio

"Não existe criatura capaz de amar outra criatura tal como ela é. Pedimos ao nosso amado para se adaptar à fantasia que sobre ele projetamos. Talvez o auge do amor partilhado consista no furor dos parceiros em se transformar um ao outro segundo suas respectivas fantasias."

(J.-D. Nasio in: A Fantasia. Ed. Zahar, p. 19)

domingo, 12 de fevereiro de 2012

dessas longínquas viagens que não empreenderá nunca - Proust

"Ainda assim, seus olhos permaneceram longo tempo perdidos no horizonte, como a gente faz quando, antes de iniciar a partida de cartas, ou de sair para jantar numa cidade, sonha com uma dessas longínquas viagens que não empreenderá nunca, mas de que sente a nostalgia, por instantes."

(Proust in: Em busca do tempo perdido vol. 5 - A Fugitiva. Tradução de Carlos Drummond de Andrade. Ed. Globo, p.201)

sábado, 11 de fevereiro de 2012

Esmagado pela certeza de que nada tão espetacular voltaria a acontecer um dia

Last night
"Foi quatro anos depois, em 1954, que Coleman e Steena quase esbarraram um no outro perto da Grand Central Station e pararam para trocar um aperto de mão, conversando apenas o tempo necessário para evocar a sensação maravilhosa que um havia despertado no outro quando tinham respectivamente vinte e dois e dezoito anos, depois cada um seguiu para um lado, esmagado pela certeza de que nada estatisticamente tão espetacular quanto aquele encontro fortuito voltaria a acontecer um dia."

(Philip Roth in: A marca humana. Ed. Companhia das Letras, p. 163)

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

da repetição amorosa - Proust

"Por mais que se esqueça um amor, ele pode determinar a forma do amor que se seguirá".

(Proust in: Em busca do tempo perdido vol. 5 - A Fugitiva. Tradução de Carlos Drummond de Andrade. Ed. Globo, p.201)

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Concurso cultural "Esquecer-te de mim"

O blog "Vem cá Luísa, me dá tua mão", em parceria com a escritora Claudia Nina - autora do recém lançado "Esquecer-te de mim" (Eb. Babel) - tem um desafio aos leitores.

Responda: O que significa para você o título "Esquecer-te de mim"?

A melhor resposta vai ganhar um livro "Esquecer-te de mim", autografado pela autora.

Algumas regrinhas:
1) Além da resposta, é preciso curtir as páginas do "Esquecer-te de mim" e do “Vem cá Luísa..." no Facebook. Quem não tem perfil no Facebook, precisa ser seguidor do “Vem cá Luísa...”
2) A resposta precisa ter no máximo 400 caracteres com espaço.
3) A promoção começa hoje (31/01) e a resposta escolhida será divulgada em 01 de março de 2012.
4) As respostas devem ser enviadas para o e-mail vanessa.sza@bol.com.br com o título de e-mail "Esquecer-te de mim". Elas devem ser escritas no corpo do e-mail.
5) Os participantes devem residir no Brasil

Felicidade que tinha em mim sumiu - Ana Letícia Leal

"Acho incrível as pessoas serem alegres. Será que são mesmo? A Rita, por exemplo. A mãe dela morreu num acidente horroroso, e ela viu. Cara, no lugar dela, eu ia ficar traumatizada. Ela ficou triste um tempo, mas passou. Ela quer ser alegre. Eu não.
Eu era feliz e não sabia.  A minha vida foi um palco iluminado que, logo após a estréia, interrompeu o espetáculo. Eu não sei o motivo. Eu não queria que fosse assim. Mas a felicidade que tinha em mim sumiu. O mais estranho é que não tenho assunto para conversar. Então, não falo. Eu não quero falar."

(Ana Letícia Leal in: Meninas inventadas. Ed. Bom Texto, p. 42)

M. Duras - e sua não-teoria do romance


"M.D. - É aos vinte e sete, vinte e oito que o ser começa a se diferenciar. Para mim é chato ficar o dia todo com estudantes que vão me fazer perguntas, ficar sem solidão. Além disso não tenho nada mesmo a lhes dizer. Se eu ficar três semanas falando de mim dessa maneira, vou enlouquecer. Ah, recusei a todos, todos. Não tenho teoria do romance. Só de pensar me dá vontade de rir."


(Marguerite Duras e Xavière Gauthier in: Boas falas - conversas sem compromisso. Ed. Record, p. 135)

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Entrevista com o escritor Tiago Rebelo

Da brevidade do amor - entrevista com Tiago Rebelo

As vicissitudes das relações amorosas são tema das cinquenta e uma histórias de "Breve História de Amor" (Editora ASA), do escritor e jornalista português Tiago Rebelo. Relações pautadas pelo contemporâneo e mediadas por SMS´s, e-mails, Facebook... O amor na era.com será mais ou menos duradouro? Só se fala de amor, e esse amor tem o ritmo em que vivemos. O título do livro fala de brevidade, ou esta brevidade se refere ao tamanho das histórias. Para entender melhor, entrevista a seguir foi feita com Tiago por... E-mail.

Vanessa - Já tens 13 livros publicados, mas "Breve História de Amor" é o primeiro que chegou às minhas mãos (até porque sua obra ainda não é editada no Brasil). Os encontros e desencontros amorosos são seu tema favorito? Fale-me disso...
Tiago - Bem, na realidade penso que são 16, se as contas não me falham, e tenho histórias de amor, entrigas entre o policial e a política, romance histórico, uma série de livros infantis, enfim, gosto de ir variando de género. De qualquer modo, está previsto começar a ser editado no Brasil ainda este ano.

Percebi que "saudade" é uma das palavras mais usadas no seu livro - embora não tenha chegado a contar quantas vezes. Algum motivo em especial para isso?
Tiago - A saudade é a nostalgia dos amores perdidos. Gosto disso e faz parte do conceito das histórias deste livro, embora não seja o único condimento. Também há muitas histórias de amores felizes.

Seus contos tratam de relacionamentos intermediados por ferramentas de comunicação do mundo contemporâneo: sms, e-mail, Facebook. Achas que elas mudaram muito a forma das pessoas se relacionarem?
Tiago - Acho. Elas fazem parte da nossa vida hoje em dia e mudaram a forma como as pessoas se relacionam. Há quem as critique ou resista, eu prefiro ver o lado positivo. Elas facilitam muito a comunicação, aproximam as pessoas, ajudam a conhecer pessoas que de outro modo nunca conheceríamos. Têm um lado bom e um lado mau, mas existem e estão para ficar.

Das suas 51 histórias curtas, algumas acabam em vazio e outras em happy end. Mas mesmo os amores que não dão certo ao final da história, tem uma narrativa leve. Senti, como leitora, angústias suaves. O desespero de um amor perdido pode ser suave?
Tiago - É uma interpretação que deixo ao leitor. Não sei se concordo que sejam sempre assim tão leves.

Quando você decidiu que escreveria livros? Houve um momento específico?
Tiago - Comecei a tentar escrever um romance pelos meus 18 anos. Não era grande coisa, mas foi um princípio e, claro, serviu para aprender.

Como é sua rotina para escrever um livro?
Tiago - Escrever todos os dias é obrigatório. De noite, normalmente, mas também sempre que tenho um bocado de tempo no resto do dia. É um trabalho, mas também é um vício.

Você modifica muito e reelabora o que escreve?
Tiago - Nem por isso. Quando retomo a escrita, revejo primeiro o que escrevi no dia anterior e depois já não altero muito mais.

Que escritores te influenciaram, ontem e hoje?
Tiago - Gabriel García Marquez, Eça de Queiroz, entre outros. Claro que estou sempre a ler novos escritores, de modo que vou aprendendo com todos.

Quais livros têm ocupado a sua cabeceira nos últimos tempos?
Tiago - Estou a ler Liberdade, de Jonathan Franzen, e a revisitar Os Maias, de Eça.


segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Esse mar no olhar (conto) - por Vanessa Souza

Dominava quatro idiomas com fluência. Passara a infância e a adolescência frequentando todas as escolas de etiqueta que a mãe a matriculava – e sabia aquelas regras que estavam em desuso hoje. Vestia-se com elegância e discrição. Tinha olhos azuis curiosos, sempre atentos ao interlocutor – uma curiosidade branda, nunca atrevida, insolente.
Trabalhava alguns meses numa grande empresa. Era assistente da secretária do diretor presidente. Logo ficaria no lugar da secretária, pois a senhora estava quase se aposentando. Catarina era uma funcionária exemplar. E ainda havia conquistado a simpatia de todos, em pouco tempo: dos sócios até a moça que servia o cafezinho. Era exímia no trabalho: nunca se atrasara, nunca ficara doente, nunca pediu para sair mais cedo nem para ir ao dentista.
Catarina cometeu apenas uma falha no trabalho, e essa era grave: apaixonou-se pelo diretor presidente. Duas falhas: sentia que o amava – e ele dizia que também a amava, porém Catarina não sabia que os homens falavam qualquer coisa nos momentos mais ardorosos. Havia ainda um terceiro equívoco: tornou-se amante dele. Não que ela considerava um equívoco ser amante do chefe. O equívoco era sofrer mais do que amar, ter muito menos do que necessitava - os quadros da realidade e da fantasia tinham um desnível abissal. Michele (italiano, a quem todos faziam graça por ter um nome feminino no Brasil) não conseguia reservar muito tempo na sua agenda para Catarina. Além da esposa, havia as filhas. Valorizava a família e bradava isso com orgulho. Desejava ser o exemplo de pai que não teve. No entanto, também desejava urgentemente a moça.
Catarina foi o único lapso de Michele, sua mácula na regrada vida de homem-trabalhador-pai-de-família. Não resistiu aos encantos da jovem esguia de cabelos impecáveis (sentia sempre um imenso desejo de deixar-lhe os cabelos em desalinho), perfume de rosas (“É Dior”, um dia ela disse a ele), fala ponderada e pausada. Michele desprezava as italianas estridentes (tal como fora suas tias e avós), e Catarina era por demais suave. Ela tinha o ritmo de bossa nova, lembrava um dia ensolarado e tranquilo. Um mar no olhar, um banquinho, um violão. Para Michele, ela também era uma imperatriz de tez de mármore, destoando nos tristes trópicos de Lévi-Strauss - devaneava.
Vieram viagens, compromissos fora da cidade. A moça dos olhos de mar nunca reclamou por não tomarem café da manhã juntos no hotel, ou por ter de ficar acompanhada de um livro na cama, aguardando por ele enquanto fazia negócios no jantar. Catarina temia ser estridente, como aquelas mulheres que ele dizia detestar. Chorava um pouquinho no travesseiro, mas logo retocava a maquiagem. Ela desejava ser a mulher que não daria trabalho, ela havia prometido a ele. Ela levava as promessas a sério. Nos fins de semana, sentia um vazio imenso. Queria que a segunda-feira chegasse logo – mesmo que só conseguisse uns beijos furtivos de Michele, isso já tornaria seu dia ensolarado, naquela cidade cinza onde sempre chovia.
Sexta-feira, fim de tarde, Michele é chamado para uma reunião com os sócios da empresa. Catarina pega seu pequeno laptop para dirigir-se ao local do encontro. É barrada antes de sair da sala, pela secretária do amante.
- Você não pode participar da reunião - lança-lhe um olhar inquisidor.
- Não entendo... Por qual motivo?
- É apenas para o senhor Michele e os sócios.
- Ah...
- E a esposa dele é um dos sócios – acrescentou, dando ênfase às palavras esposa e dele.
Catarina sente vertigem e senta. Tenta recompor-se, olha o relógio de pulso dourado.
- Tudo bem, já é hora de ir mesmo. Vou para casa – queria sair correndo daquele lugar, rápido.
- Catarina, ouça – a mulher pronuncia de forma professoral, como se uma grande lição estivesse por vir – vou te ensinar uma coisa... Você é bonita e competente. Mas amantes, querida, são objetos a serem facilmente descartados. Não faz muita diferença quão bela e inteligente você é. Nem o fato de ter visitado mais museus ou lido mais livros do que a maioria das meninas da sua idade. Será a mulher dos bastidores. Sempre será, até ele se cansar. A esposa e as filhas são aquelas que posam no retrato da mesa.
Catarina sentiu-se golpeada no estômago com as palavras-luvas-de-boxe. Pegou sua bolsa Birkin preta com a máxima dignidade que conseguiu e desejou bom fim de semana para a portadora das más notícias, antes de sair. Realista demais, cruel demais. Foi desejando bom final de semana para todos que encontrou até sair do prédio, com seu sorriso congelado de boneca Barbie. Respirou fundo, engoliu o pranto, entrou na confeitaria elegante da esquina e pediu uma fatia de torta de brigadeiro com calda extra de chocolate. Dá a primeira garfada com certa violência e pensa:
- Amanhã, sem falta, procuro outro emprego.

Por Vanessa Souza

Rio, 05 de fevereiro de 2012.

Passem por lá!

http://diariosbordados.blogspot.com/2012/02/menina-dor-e-roupa.html

Vale muito o clique :)

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Naquele dia, estava difícil ter pensamentos generosos (Philip Roth)

"O pensamento que tive não foi dos mais generosos. Naquele dia, estava difícil ter pensamentos generosos. O que me ocorreu foi: Qual o problema? Quando ele estava aqui, você não fazia muita questão de vê-lo".

(Philip Roth in: A marca humana. Ed. Companhia das Letras, p. 397)

A paixão é só um momento, uma emoção fátua

Ano passado em Marienbad
"A paixão é só um momento, uma emoção fátua, constata. Sente saudades dela. Foi bom tê-la e vai guardá-la para sempre como uma recordação boa, mas a mulher daquela época, não esta, que não sei quem é, pensa."

(Tiago Rebelo in: Breve História de Amor. {Conto: Acaso num dia de Inverno} Ed. ASA, p. 126)

Geralmente, em ficção, um personagem fala e o outro ouve, e, tendo ouvido e compreendido, responde.

"Na vida, é raro que sejamos realmente capazes de ouvir e quem encontremos alguém que nos ouça. No entanto, é inusitado encontrar o fenômeno mais comum - a desatenção - aparecendo na página impressa. Geralmente, em ficção, um personagem fala e o outro ouve, e, tendo ouvido e compreendido, responde. Assim, a fidelidade ao modo como a desatenção opera na realidade é mais um aspecto no diálogo de Henry Green pode nos impressionar como mais próximo ao que observamos na vida real que o diálogo que lemos na obra de outros escritores."

(Francine Prose in: Para ler como um escritor. Ed. Zahar, p.155)

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Porque é nessa hora que você ama uma pessoa - quando você a imagina decidida a suportar o pior

"Nunca se sentiu tão próximo dela quanto naquele momento.  Era possível? Coleman nunca se sentira tão próximo de uma pessoa na vida! Ele a amava. Porque é nessa hora que você ama uma pessoa - quando você a imagina decidida a suportar o pior. Não corajosa. Não heróica. Só decidida."

(Philip Roth in: A marca humana. Ed. Companhia das Letras, p. 51)

consegui ao menos fazer desaparecer-lhe do rosto aquela expressão alegre (Proust))

"(...) consegui ao menos fazer desaparecer-lhe do rosto aquela expressão alegre que deveria fazer-me feliz e que, como tantas vezes acontece quando ainda estão vivas as criaturas a quem mais amamos, se nos apresenta como a exasperante manifestação de um defeito mesquinho mais que preciosa forma de felicidade que tanto lhes desejaríamos proporcionar."

(Marcel Proust in: Em busca do tempo perdido vol. 2 - À sombra das raparigas em flor.Tradução de Mario Quintana. Ed. Globo, p. 434)

Uma escritora é o território estrangeiro - Marguerite Duras

Erica Jong
"Os homens gostam das mulheres que escrevem.  Não o dizem. Uma escritora é o território estrangeiro."

(Marguerite Duras in: A vida material. Ed. Globo, p. 68)

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

lhe abrira o espírito ao invisível, pusera-lhe seriedade na vida, delicadezas no coração - Proust

In the mood for love
"A amante lhe abrira o espírito ao invisível, pusera-lhe seriedade na vida, delicadezas no coração, mas tudo isso escapava à família em pranto, que repetia: "Essa desavergonhada ainda o matará e, enquanto isso, o desmoraliza."

(Marcel Proust in: Em busca do tempo perdido vol. 2 - À sombra das raparigas em flor.Tradução de Mario Quintana. Ed. Globo, p. 430)

Estamos todos nos preparando para a vida nas cápsulas espaciais?

"Às vezes, quando encontro meus bons amigos, a presença física deles me toma de assalto. Fico chocada em vê-los em carne e osso. Estou acostumada às suas vozes, mas seus rostos parecem intensos demais, perturbadoramente intensos. Estamos todos nos preparando para a vida nas cápsulas espaciais? É por isso que levamos essa vida em casulo, na qual a vida social se faz digitalmente?"

(Erica Jong in: O vício da paixão. Ed. Círculo do Livro, p. 186)

das esperas, sempre - T. Salem Levy

 "Já não era eu quem decidia: a mim, a espera".

(Tatiana Salem Levy in: Dois rios. Ed. Record, p. 132) 

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

eu não sou daqui, nem de lá - Caio F.

"- Eu também não sou daqui - explicou Maurício. - Sou do interior. Viemos faz pouco tempo de lá, não conheço ninguém.
- Eu também não ninguém. Só você agora.
Sorriram um para o outro. A solidão e a timidez unido-os com sauvidade. Começaram a caminhar."

(Caio F. in: Limite branco. Ed. Siciliano, p. 100-101)

Aquele que se entrega ao outro como um prisioneiro de guerra deve antes entregar todas as armas - Milan Kundera



"Não encontro outra explicação senão a de que o amor não era para ela o prolongamento, mas sim a antítese de sua vida pública. O amor era para ele o desejo de se entregar às vontades e caprichos do outro. Aquele que se entrega ao outro como um prisioneiro de guerra deve antes entregar todas as armas. Vendo-os sem defesa, não pode deixar de se indagar quando virá o golpe. Posso, portanto, dizer que o amor para Franz era a espera contínua do golpe que iria atingí-lo."

(Milan Kundera in: A insustentável leveza do ser. Ed. Record, p. 88-89)