quarta-feira, 28 de abril de 2010

Michel Onfray X Freud II


Por BBC Brasil – Agência Estado

Filósofo Michel Onfray causa furor questionando capacidade de cura de disciplina ‘que diz respeito a Freud e ninguém mais’.

Um novo livro que acusa o pai da psicanálise, Sigmund Freud, de ser mentiroso, fracassado e defensor de regimes totalitários está criando polêmica na França.

De acordo com o filósofo francês Michel Onfray, autor de Le Crépuscule d’une idole, l’affabulation freudienne (O Crepúsculo de um Ídolo, a Fábula Freudiana), a psicanálise é comparável a uma religião e sua capacidade de curar as pessoas é semelhante a da homeopatia.

O livro começou a ser vendido nesta semana nas livrarias francesas, mas já havia começado a gerar controvérsia antes mesmo de sua publicação. Psicanalistas acusam Onfray de cometer erros e ignorar fatos para defender a sua tese.

‘Necessidades fisiológicas’

O conhecido filósofo, que escreveu Tratado de Ateologia (publicado também no Brasil), acredita que Freud transformou seus próprios “instintos e necessidades fisiológicas” em uma doutrina com pretensão de ser universal.

Mas, para Onfray, a psicanálise seria “uma disciplina verdadeira e justa no que diz respeito a Freud e ninguém mais”.

Onfray diz que Freud fracassou na cura de pacientes que ele mesmo atendeu, mas ocultou ou alterou suas histórias clínicas para dar a impressão de que o tratamento havia sido bem sucedido.

Ele afirma, por exemplo, que Sergei Konstantinovitch, indicado por Freud como “o homem dos lobos”, continuou fazendo psicanálise mais de meio século depois de ter sido supostamente curado por Freud.

E diz que Bertha Pappenheim, conhecida como “Anna O.” e apresentada por Freud como um caso em que o tratamento contra histeria e alucinações funcionou, continuou tendo recaídas.

Durante um debate com a psicanalista francesa Julia Kristeva publicado esta semana no jornal francês Le Nouvel Observateur, Onfray rejeitou a noção de que o método de Freud “cura todas as vezes”.

“A psicanálise cura tanto quanto a homeopatia, o magnetismo, a radiestesia, a massagem do arco do pé ou o exorcismo feito por um sacerdote, quanto nenhuma oração diante da Gruta de Lourdes (onde há relatos de que Nossa Senhora teria aparecido)”, afirmou.

“Sabemos que o efeito do placebo constitui 30% da cura de um medicamento”, acrescentou. “Por que a psicanálise escaparia desta lógica?”

Dinheiro, sexo e fascismo

Além de questionar o método de Freud, Onfrey criticou sua personalidade e o apresenta como alguém que foi capaz de cobrar o equivalente ao que seriam hoje US$ 600 por uma sessão, e incapaz de tratar dos pobres.

O filósofo francês diz que acredita que Freud tinha preconceito contra homossexuais e com um interesse especial em temas como abuso sexual, complexo de Édipo e incesto, e que dormia com a cunhada.

Em termos ideológicos, Onfray defende a tese de que Freud flertou com o fascismo e diz que em 1933, ele escreveu uma dedicatória elogiosa para Benito Mussolini: “Com as respeitosas saudações de um veterano que reconhece na pessoa do dirigente um herói da cultura.”

Ele afirma que o criador da psicanálise procurou se alinhar com o chanceler Engelbert Dollfuss, que instaurou o “austrofascismo” no país, e também às exigências do regime nazista.

‘Ódio’

O livro gerou uma onda de troca de acusações e protestos nos círculos intelectuais da França.

A historiadora e psicanalista Elisabeth Roudinesco afirmou em artigo em Le Nouvel Observateur que o novo texto de Onfray está “cheio de erros” e “rumores”.

Roudinesco acusou Onfray de ter tirado as coisas do contexto e afirmou que Freud “de maneira alguma apoiou o fascismo e nunca fez apologia dos regimes autoritários”.

“Quando sabemos que oito milhões de pessoas na França tratam-se com terapias derivadas da psicanálise, está claro que no livro e nas palavras do autor há uma vontade de causar danos”, disse.

Em seu debate com Onfray, Kristeva defendeu a psicanálise como um mecanismo capaz de tratar de problemas como a histeria, o complexo de Édipo ou comportamento anoréxico ou bulímico, entre outros.

“Onfray nos insulta quando diz que a psicanálise não cura”, escreveu o psiquiatra e psicanalista Serge Hefez no semanário Le Point. “O que fazemos todos nós em nossos consultórios, centros de terapia familiar, conjugal, nossos hospitais (…) senão ajudar o sujeito a se converter em ator de sua própria história?”

Hefez disse que “a psicanálise cura, é um tratamento útil e vivo praticado por milhares de terapeutas conscienciosos que conhecem fracassos, sucessos parciais e sucessos.”

Onfray respondeu que várias reações contra seu livro evitam responder seus argumentos centrais e, em um artigo publicado no jornal francês Le Monde, perguntou se era impossível fazer uma leitura crítica de Freud.

“Com este livro, alguns amigos haviam me adiantado o ódio porque me metia com o bolso”, escreveu. “Hoje eu me dou conta do quão certos estavam”.

10 comentários:

  1. Nunca achei que psicólogos são grande ajuda, e na verdade é até perigoso acreditar cegamente no poder que têm. Isso pode distanciar a pessoa da realidade, e é melhor desabafar com um velho amigo que meter-se a mente aberta e tentar revelar tudo a um desconhecido que está escutando-te (será?) pacientemente atrás do divã onde tu te deitas e relata teu passado e presente.

    Mas, é difícil analisar. A búlgara Julia Kristeva ficou chocada, é natural para alguém que apóia a psicanálise como doutrina válida por décadas, mas os argumentos de Onfray, de que pacientes tratados por Freud não se curaram, não podem ser igorados.

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  2. Temos que levar em conta o ambiente, o tempo e os fatos e o conhecimento que existia na época.

    Por acaso já disseram que a terra era plana?

    Se o efeito placebo ajuda.. pronto ajuda!

    Se cobrar caro uma consulta é crime... nossa fuja dos advogados em são paulo! E olha que eles nem são tão bons assim para ouvir seus problemas...rs..rs

    Não quero defender, mas criticar um trabalho notoriamente reconhecido é querer chamar a atenção para si. Quanto será que esse cara cobra por uma palestra?

    bjus

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  3. Concordo com o Abdoul acima. Palavras sensatas "os argumentos de Onfray, de que pacientes tratados por Freud não se curaram, não podem ser igorados." Esse negócio de verdades eternas, a meu ver,so em outra vida.

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  4. Acho que as pesquisas do Freud foram importatíssimas para entendermos certos comportamentos humanos, mas como Onfray tb questiono o processo de cura usada pela psicanálise.
    Sou leiga no assunto, sou apenas uma paciente de uma psicóloga que utiliza o método comportamental, de Skinner.
    Bjo

    http://futilidadesqueamamos.blogspot.com/

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  5. Penso que é de extrema importância considerarmos que, corajosamente, Freud publicou os seus casos, enfatizando os seus erros de diagnóstico, condução do tratamento, etc.
    Isso é algo louvável! Especialmente considerando o atual dilúvio de terapias... duvidosas(?) que se proliferam atualmente.
    E, bem, a Psicanálise é empírica. Apenas quem se submete a ela pode, de fato, avaliar.
    Ah! E que se considere as devidas diferenças.
    Terapia, Psicoterapia, Psicanálise...já que são coisas completamente diferentes!
    Abraço!
    Parabéns pelo blog!

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  6. Não posso falar sobre tal...afinal não conheço Freud (No sentido de ser capaz de comentar)!

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  7. Vou ler.
    O problema da psicanálise é um só: os psicanalistas - esses que no lugar de um são jorge; nossa senhora da aparecida; exú cavera, tranca rua e etc...colocam um bonequinho de Freud.
    Amém.

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  8. Todo homem reconhecido mundialmente por suas qualidades, está sujeito a duras críticas.
    Freud não escapou desta regra, ainda mais causando tanta polêmica, mas repetindo muito o teatro grego e o que cantam os poetas do mundo.
    Parabéns, Vanessa.

    Abraço
    Jorge

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  9. Verdades eternas, concordo, não existem. Mas verdades perecíveis, sim. Concordo com a amiga ali que disse que o problema da psicanálise são os psicanalistas que transformam uma teoria (e, por isso, como diria Foucault, uma caixa de ferramentas) em religião. Então sim, critiquemos teorias - inclusive a obra de Onfray, por que não? - mas sejamos sensatos ao admitir que nem as críticas são universais. A psicanálise pode, sim, oferecer conceitos que operam no trabalho de psicoterapia. Ao criticar a psicanálise do jeito conservador e tosco que Onfray o fez, ele me decepciona enquanto intelectual. Acho que uma análise faria bem pra ele (ou quem sabe um yoga, meditação, terapia corporal, etc etc), pois tudo o que ele deixa transparecer é um homem desesperado por olofotes.
    Parabéns pelo blog!

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  10. Freud, Marx...mitos que ainda infectam muitas mentes...

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