quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Não eras de assentimentos fáceis

“Sobreviveria sem ti, no permanente campo de batalha da tua memória. Falarias de mim a gerações sucessivas de estudantes, e eu viveria nas tuas histórias quando já nem o pó dos meus ossos se distinguisse.
Colecionava cartas. Fotografias. Sublinhavas os livros a verde e vermelho. Escrevias nas margens. Não eras de assentimentos fáceis. (...) Perdoavas pouco, e a poucos.”

(Inês Pedrosa in:Fazes-me falta, p. 124)

Caio F. + Freud - Conlapsa e eu


Esta tarde apresento no Conlapsa o artigo:

"Psicanálise e escritores criativos: lendo Caio F. a partir de Freud”
Autor: Vanessa Souza (RJ/ UVA) / Co-Autor: Maria Cristina Poli (UFRJ)

Às 14h, Sala N


Acaso alguém aqui esteja inscrito no congresso, aparece lá!


I CONGRESSO LATINO-AMERICANO DE PSICANÁLISE NA UNIVERSIDADE (CONLAPSA)

LOCAL: UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

ENDEREÇO: RUA SÃO FRANCISCO XAVIER, 54O - MARACANÃ

profunda falta de alguma coisa


"Há meses não havia sol, ninguém  mandava notícias de lugar algum, o dinheiro estava no fim, pessoas que eu considerava amigas tinham sido cruéis e desonestas. Pior que tudo, rondava um sentimento de desorientação. (...) Eu sentia profunda falta de alguma coisa que não sabia o que era. Sabia só que doía, doía. Sem remédio."


(Existe sempre alguma coisa ausente. Caio F. in: Pequenas Epifanias. Ed. Agir, p. 100-101)

terça-feira, 30 de agosto de 2011

das dores

"Dor branca, querendo primeiro compreender, antes de doer abolerada, a dor. Doeria mais tarde, quem sabe, de maneira insensata e ilusória como doem as perdas para sempre perdidas, e portanto irremediáveis, transformadas em memórias iguais pequenos paraísos-perdidos. Que talvez, pensava agora, nem tivessem sido tão paradisíacos assim."

(Anotações insensatas. Caio F. in: Pequenas Epifanias. Ed. Agir, p. 65)


Que se foda o carinho

"(...) que continuava a ter muito carinho por ela e que se veriam um dia destes. Carinho. A palavreca chilra que os homens usam como preservativo do amor. Que se foda o carinho".

(Os íntimos, Inês Pedrosa, Ed. Alfaguara, p. 108)

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Abandono

“- Eu sei.
- Sabe?
- Sim, Jane. Sei.
Não perguntei como e, abruptamente, me despedi. Estou fraca demais para suportar a dor de outra pessoa. Quero me concentrar na minha. O egoísmo dos recém-abandonados. Ninguém sofreu como eu sofri. Tire este sofrimento amargo de mim. Não é para mim este cálice amargo. Maldito seja. Não me obrigue a bebê-lo. Aargh. Pronto, pronto. Já acabou. Até a última gota. Muito bem. Boa garota. Você bebeu até a última gota. É a melhor maneira, creia-me. Todo este negócio de golinhos e de todo mundo segurando a mão. Uma total perda de tempo. Abra a boca. Deixe a lava entrar. Descer pela língua e pela garganta abaixo, arrancando a membrana. Bom, tudo vai soar diferente e ter um gosto diferente. Como deve ser.”

(Josephine Hart in: Abandono. Ed. Record, p. 55)

A linguagem é uma pele - Barthes

“A linguagem é uma pele: esfrego minha linguagem no outro. É como se eu tivesse palavras ao invés de dedos, ou dedos na ponta das palavras. Minha linguagem treme de desejo. A emoção de um duplo contacto: de um lado, toda uma atividade do discurso vem, discretamente, indiretamente, coloca em evidencia um significado único que é “eu te desejo”, e liberá-lo, alimentá-lo, ramificá-lo, fazê-lo explodir (a linguagem goza de se tocar a si mesma); por outro lado, envolvo o outro nas minhas palavras, eu o acaricio, o roço, prolongo esse roçar, me esforço em fazer durar o comentário ao qual submeto a relação.”

(Roland Barthes in: Fragmentos de um discurso amoroso. P. 64)

domingo, 28 de agosto de 2011

não suportamos essa doçura


"Afirmou, depois de acender o cigarro reformulou, repetiu, acrescentou esta interrogação: não suportamos mesmo aquilo ou aqueles que poderiam nos tornar mais felizes e menos sós? Não, não suportamos essa doçura."

(Anotações insensatas. Caio F. in: Pequenas Epifanias. Ed. Agir, p. 64-65)

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

no canto

"Adquirira desde longos anos, por medo às desfeitas, o hábito de manter-se no seu lugar, de ficar no seu canto, tanto na vida como no trem, e esperar que lhe dessem bom-dia para estender a mão."

(Marcel Proust in: Em busca do tempo perdido vol. 4 - Sodoma e Gomorra.Tradução de Mario Quintana. Ed. Globo, p. 232)

é terra dos outros, onde os outros estão contentes

"É engraçado que pensando bem não há um verdadeiro lugar para se viver. Tudo é terra dos outros, onde os outros estão contentes."

(Carta de Clarice Lispector para suas irmãs. Berna, 05 de maio de 1946. Olga Borelli in: Clarice Lispector, Correspondências, p. 80)

Você violou a lei do distanciamento estético (...) o distanciamento que é essencial pra você poder fruir

Elegy
"Com essa garota você sempre vai ser indefeso. Você nunca vai poder dar as cartas. Tem alguma coisa nela", disse George, "que enlouquece você, que sempre vai enlouquecer você. Se não cortar esta ligação de uma vez por todas, essa coisa vai acabar destruindo você. Com ela, você não está mais satisfazendo uma necessidade natural. Isso é patologia na forma mais pura. Olha", disse-me ele, "encare a vida como um crítico, do ponto de vista profissional. Você violou a lei do distanciamento estético. Você sentimentalizou a experiência estética proporcionada por essa garota - você personalizou, sentimentalizou a experiência, perdeu o distanciamento que é essencial pra você poder fruir."

(Philip Roth in: O animal agonizante. Ed. Companhia das Letras, p. 84)

domingo, 21 de agosto de 2011

em parte porque não podia, nem posso ou podemos, prever o futuro

"O que eu não sabia nem poderia saber - em parte porque aos 20 anos a gente pouco sabe além da própria fome, em parte porque não podia, nem posso ou podemos, prever o futuro - é que embora parecesse tarde, era ainda cedo."

(Para ler ao som de Vinícius de Moraes. Caio F. in: Pequenas Epifanias. Ed. Agir, p. 121)

sábado, 20 de agosto de 2011

sofrimento eufórico, aquilo a que chamavas de felicidade

Elegy
"(...) pelo menos não saiste da vida sem a tua dose de sofrimento eufórico, aquilo a que chamavas de felicidade. (...) Não era ciúmes; achava graça em teus dilaceramentos passionais, e nem um limo da minha alma se movia ao imaginar-te nos braços deles."

(Inês Pedrosa in:Fazes-me falta, p. 139)

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

frágil - Leminski

"coração
PRA CIMA
escrito embaixo
FRÁGIL".

(não fosse isso, Paulo Leminski)

???

“Quem sou eu para mim? Só uma sensação minha.”

("A obra em prosa de Fernando de Pessoa". Livro do desassossego, 1ª. Parte, Introdução e nova organização de textos de António Quadros. Publicações Europa-América, p. 289)

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

a coleção de argumentos para ir avolumava-se na mesma medida em que crescia a lista de motivos para ficar

"Um repertório de desculpas pode ir sempre mais longe do que uma verdade, quando ainda não se descobriu que querer enfrentar tudo-ao-mesmo-tempo-o-tempo-inteiro é quase a mesma coisa que não enfrentar. Minha coleção de argumentos para ir avolumava-se na mesma medida em que crescia a lista de motivos para ficar. Mil razões apontando para a porta, mil e uma para o sofá, e eu ali, deitado no colo da dúvida, exausto por ter que amadurecer tanto em tão pouco tempo."

(Luciana Lorens Braga in: Há cores e acordes. Ofício das Palavras, Ed., p. 28-29)

Os últimos românticos da Rua Augusta - e do meu estranhamento na aborrecência

Há uns 15 anos, eu passava meus sábados à tarde com um livro, num porão com cheiro de bolor, esperando que meu primeiro namoradinho terminasse o ensaio da banda, qual era mesmo o nome da banda? (Da série: meu passado me condena). Eu nem lembrava disso quando ontem, zapeando pela TV antes de assistir uma adaptação de "O Idiota", do Dostô, parei num programa da MTV (eu que nunca assisto televisão) e vejo duas figuras da minha adolescência, lá da minha cidade natal: Cristiano (que hoje assina Cristiano Carlos) e Gustavo André (que todos chamam de Kally). Para quem não sabe, não sou carioca, nasci numa cidadezinha linda no interior de Santa Catarina, chamada Blumenau.

Para ser honesta, eu brigava muito com o Cristiano (que vivia grudado no namorado que eu tinha e me chamava de fresca e coisas afins) e ficava muito brava quando eles diziam que a maldita da garrafa de cerveja era a "saideira", e nunca era. Uma questão de inadaptação: meu lugar nunca foi boteco de madrugada - nem de dia - (eu que só bebo água sem gás e suco de abacaxi com hortelã), não gosto das multidões dos shows de rock e acampamento com mosquitos é a maior cilada que existe pra mim. Eles adoravam tudo isso, eu que era a estranha no ninho. O Gustavo, que eu sempre achei meio escatológico, namorou por tempos minha melhor amiga de faculdade - que não citarei o nome aqui por não saber se hoje ela tem um namorado ciumento.

Depois desse prelúdio, fica a dica para quem gosta do estilo musical - seja lá qual ele seja, receio de cometer alguma gafe. Os meninos estão num projeto chamado "Os últimos românticos da Rua Augusta", com o Wander Wildner, Luciano Clóvis e Sérgio Henrique.

Vídeo deles. 

Fiquei feliz de ver gentes da minha adolescência por aí. Tempos que não voltam. Que bom ;)


mas para registrar o deserto por ele deixado

"E que sua tristeza também era feita da suposição da nossa felicidade. (...) Pensei na concomitância do menino e do mar, na sua diferente parecença, arrebatadora. Disse-me que se escreve sobre o corpo morto do mundo e, da mesma maneira, sobre o corpo morto do amor. Que era nos estados de ausência que a escrita se abismava para não substituir nada do que havia sido vivido ou supostamente vivido, mas para registrar o deserto por ele deixado."

(Marguerite Duras in: O verão de 80. Ed. Record, p. 65)

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

É...


“É,
Só eu sei
Quanto amor
Eu guardei
Sem saber
Que era só
Pra você.

É, só tinha de ser com você,
Havia de ser pra você,
Senão era mais uma dor,
Senão não seria o amor,
Aquele que a gente não vê,
O amor que chegou para dar
O que ninguém deu pra você.
O amor que chegou para dar
O que ninguém deu pra você.

É, você que é feito de azul,
Me deixa morar nesse azul,
Me deixa encontrar minha paz,
Você que é bonito demais,
Se ao menos pudesse saber
Que eu sempre fui só de você,
Você sempre foi só de mim”.

(Só tinha de ser com você. Composição de Tom Jobim/ Aloysio de Oliveira)

terça-feira, 16 de agosto de 2011

vida dura

Michel Ochs
"Quando entrava em um recinto, imediatamente os homens a imaginavam de todas as formas, enquanto as mulheres a detestavam instintivamente."

(David Foenkinos in: A delicadeza. Ed. Rocco, p. 80)

do que não é dito

"(...) as frases jamais ditas que fibrilavam entre eles, no meio daquilo que era e não era o silêncio."

(Luciana Lorens Braga in: Há cores e acordes. Ofício das Palavras Ed., p. 19)

distraídas que ficam da necessidade de continuarem as mesmas uma para a outra


"Não sei: é silêncio apenas. Somente a memória fala: porque é certo que as pessoas estão sempre crescendo e se modificando, mas estando próximas uma vai adequando o seu crescimento e a sua modificação ao crescimento e a modificação da outra; mas estando distantes, uma cresce e se modifica num sentido e outra noutro completamente diferente, distraídas que ficam da necessidade de continuarem as mesmas uma para a outra."


(Caio F. in: Inventário do ir-remediável. Ed. Sulinas, p. 107)

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

só não queria que me doesse tanto

"(...) essa música indefinida machucando por dentro, como se estivesse desde sempre aqui, escorregando devagar..."

(Caio F. in: Inventário do ir-remediável. Ed. Sulinas, p. 64)

Se quiser ouvir...

mais do que

Gigi
" - Maus modos à mesa, querida Gigi, tem destruído mais lares do que a infidelidade."


(Do filme: Gigi - embora a frase seja do Oscar Wilde)

Parecia aquele vestido a materialização dos raios escarlates de um coração

“Eu estava menos triste que de costume, porque a melancolia de sua expressão, a espécie de clausura que a violência da cor punha em torno dela e o resto do mundo, lhe davam alguma coisa de infeliz e solitário que me tranqüilizava. Parecia aquele vestido a materialização dos raios escarlates de um coração que eu talvez pudesse consolar; refugiada na luz mística do tecido de ondas mansas, fazia-me pensar nalguma santa das primeiras épocas cristãs. Tinha então vergonha de afligir aquela mártir com a minha vista. “Mas afinal de contas a rua é de todo mundo”.

(Marcel Proust in: Em busca do tempo perdido vol. 3 - O caminho de Guermantes.Tradução de Mario Quintana. Ed. Globo, p. 109)


domingo, 14 de agosto de 2011

aranha silenciosa, ia tecendo a sua teia

"Ela, porém, tinha a vida fria de um celeiro aberto para o norte; e o tédio, aranha silenciosa, ia tecendo a sua teia na sombra de todos os cantos do seu coração."

(Gustave Flaubert in: Madame Bovary)

se imaginava agarrada àquele momento

"Tentava  não pensar no futuro imediato, nem no passado, e se imaginava agarrada àquele momento, ao precioso presente, como um alpinista sem cordas num penhasco, a esmagar o rosto contra a pedra, sem coragem de se mexer."

(Ian McEwan in: Na praia. Ed. Companhia das Letras, p. 86)

sábado, 13 de agosto de 2011

e basta um movimento ínfimo dos lábios

"Estava de volta a valsa dos sorrisos. É incrível como, às vezes, tomamos decisões, dizemos a nós mesmos que de agora em diante tudo será assim ou assado, e basta um movimento ínfimo dos lábios para quebrar toda a segurança de uma certeza que parecia eterna."

(David Foenkinos in: A delicadeza. Ed. Rocco, p. 119) 

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

o maior de todos

“Toda pessoa julga seu sofrimento maior do que o dos outros. Como se secretamente acreditasse ser mais esperta e digna de fama.”

(Erica Jong in: Salve sua vida. Ed. Círculo do Livro, p. 18)

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

nunca acreditou realmente que palavras duras pudessem ser desditas ou esquecida

"Sabia muito bem que as pessoas costumavam brigar, até mesmo tempestuosamente, e depois faziam as pazes. Mas não sabia como começar, simplesmente não tinha jeito para isso, para a alteração capaz de aliviar as tensões, e nunca acreditou realmente que palavras duras pudessem ser desditas ou esquecidas. O melhor era manter as coisas simples."

(Ian McEwan in: Na praia. Ed. Companhia das Letras, p. 43)

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

...

“O amor à humanidade é uma abstração através da qual não se ama senão a si mesmo.” 

(Dostoiévski in: O idiota)

terça-feira, 9 de agosto de 2011

que poderia se chamar de Distanciar-se


" 1- O sujeito apaixonado pode escrever um livro sobre o amor. Ele escolhe então aparentemente um exílio a si mesmo como amante, renega o amor para descrevê-lo. Parece abandonar a literatura para praticar a crítica, na ilusão de que isso o cure melhor do amor. Ele pretende ignorar que ele pratica assim uma figura clássica do discurso amoroso, que poderia se chamar de Distanciar-se."

(Calligaris, Contardo. Fragmentos de um discurso amoroso. In: O amor na literatura. Vários autores. Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, p. 118-119)

uma distância

 "Ele nunca avançava demais, pois ela impunha uma distância que para ele parecia insuportável. Ela não entrava no jogo dele, simplesmente porque não conseguia jogar. Estava acima de suas forças."

(David Foenkinos in: A delicadeza. Ed. Rocco, p. 47) 

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

tão inacessíveis, como as que formara a imaginação e a realidade destruíra

Morte a Venezia
"As imagens escolhidas pela recordação são tão arbitrárias, tão estreitas, tão inacessíveis, como as que formara a imaginação e a realidade destruíra. Não há razão para que, fora de nós, um local verdadeiro possua antes os quadros da memória que os do sonho. E depois, uma realidade nova talvez nos faça esquecer, detestar até os desejos pelos quais havíamos partido."

(Marcel Proust in: Em busca do tempo perdido vol. 4 - Sodoma e Gomorra.Tradução de Mario Quintana. Ed. Globo, p. 124)

o sujeito apaixonado pode querer se curar do amor escrevendo a história do seu amor.

"ESCREVER: o sujeito apaixonado pode querer se curar do amor escrevendo a história do seu amor. Isso, aliás, significa que vivendo o seu amor, ele se consola e se cura, pois o amor que vive já está necessariamente escrito, já faz parte da literatura. Escrever a história do próprio amor não é diferente de amar, mesmo sem escrever."

(Calligaris, Contardo. Fragmentos de um discurso amoroso. In: O amor na literatura. Vários autores. Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, p. 118)

sobre ouvir


“Ouvir é dos trabalhos mais duros que existem. Por isso escolhi a oncologia, em vez da psiquiatria. Os cancerosos não dizem
- repita lá isso, doutor.”

(Inês Pedrosa in: Os íntimos. Ed. Alfaguara, p.41)

domingo, 7 de agosto de 2011

o grito da escrita

Soigne ta droit
"O escrito é o grito das feras noturnas, de todos, de você e eu, o grito dos cães."


(Marguerite Duras in: Escrever. Ed. Rocco, p. 13)

nossas memórias não são como ficção. Elas são ficção.

"Afinal, quando Marcel era criança em Combray, comendo biscoitos madeleine à vontade, tudo que queria era fugir de sua cidade pequena. Mas assim que o fez, passou a sonhar incessantemente em recuperar a infância preciosa que desperdiçara futilmente. Essa é a ironia da nostalgia proustiana: lembrar dos acontecimentos como sendo bem melhores do que realmente foram. Mas, pelo menos, Proust estava bastante ciente da própria fraude. Sabia que a Combray de que tinha saudades não era a Combray que existira. (Como ele mesmo disse, "o único paraíso é o paraíso perdido".) Não era culpa dele: simplesmente não havia como descrever o passado sem mentir. Nossas memórias não são como ficção. Elas são ficção."

(Jonah Lehrer in: Proust foi um neurocientista - Como a arte antecipa a ciência. Ed. Best Seller, p. 134)

um sorriso que não queria dizer nada

"Ela sorriu um sorriso que não era bem um sorriso, era mais uma pequena contração dos músculos do rosto, acho que não queria dizer nada."

(Adriana Lisboa in: Um beijo de colombina. Ed. Rocco, p. 113)

sábado, 6 de agosto de 2011

se...

"Ficaríamos para sempre curados do romantismo se, para pensar naquela a quem amamos, procurássemos ser aquele que seremos quando não mais a amamos."

(Marcel Proust in: Em busca do tempo perdido vol. 4 - Sodoma e Gomorra.Tradução de Mario Quintana. Ed. Globo, p. 113)

percurso do Titanic

"Era como o encerramento súbito de alguma coisa que o movera durante anos. O fim de uma possibilidade. A noite tinha conhecido o mesmo percurso do Titanic. Inicialmente festiva, morria agora em pleno naufrágio. A verdade tem, com frequência, as dimensões de um iceberg".
 
(David Foenkinos in: A delicadeza. Ed. Rocco, p. 54) 

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

De qualquer maneira, a experiência não nos ensina necessariamente nada.

An education
"- Eu compreendo. Não se preocupe. Com o tempo, vai melhorar.
- Não devia ser tão paciente comigo, Sarah.
- Não sei o que é o amor, se não é paciência.
- Mas, Sarah, você diz isso de tudo o que lhe peço. O que é coisa demais. Você diz: "Não sei o que é o amor se não é a bondade." "Não sei o que é o amor se não é compreensão." Talvez, Sarah, seja apenas piedade?
- O que há de errado com a piedade? Há um amor em toda a piedade. E alguma piedade em tudo o que é amor.
(...) - Como é que você sabe? Você é tão moça, Sarah.
- Todo mundo sabe essas coisas.
- Nem todo mundo sabe.
- Você está enganado. É só que nem todo mundo age de acordo com elas. De qualquer maneira, a experiência não nos ensina necessariamente nada. Algumas vezes, ocorre exatamente o oposto."

(Josephine Hart in: Abandono. Ed. Record, p. 167-168)

Era só para dar forma àquela sensação

“O que eu começava a escrever como se fosse ela nem precisava ser bom. Nem precisaria ser publicado. Ninguém leria. Era só para dar forma àquela sensação de andar por ruas líquidas e respirar um ar pastoso e dormir noites ocas, era só para saber o que fazer com o céu pastoso quando ele crescia, se avolumava e perigava cair sobre a minha cabeça como uma samambaia que despencasse da varanda.”   

(Adriana Lisboa in: Um beijo de colombina. Ed. Rocco, p. 73)

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

do cansaço

“Amar é cansar-se de estar só: é uma cobardia portanto, e uma traição a nós próprios (importa soberanamente que não amemos).”

("A obra em prosa de Fernando de Pessoa". Livro do desassossego, 1ª. Parte, Introdução e nova organização de textos de António Quadros. Publicações Europa-América, p. 312)

da espera

"A perda de toda bússola, de toda direção, que caracteriza a espera, ainda persiste, após a chegada do ente esperado, e, substituindo em nós a calma em que imaginávamos com tanto prazer a sua chegada, impede-nos de sentir o mínimo prazer que seja. Albertine ali estava, meus nervos, destroçados, continuando a sua agitação, esperavam-na ainda."

(Marcel Proust in: Em busca do tempo perdido vol. 4 - Sodoma e Gomorra.Tradução de Mario Quintana. Ed. Globo, p. 113)

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

que muito tempo se chorou, depois veio o esquecimento e

500 days of Summer
"Eu não amava mais a Gilberte. Era para mim como uma morta que muito tempo se chorou, depois veio o esquecimento e, se ressuscitasse, não mais poderia inserir-se numa vida que já não é feita para ela. Não tinha mais vontade de vê-la, nem mesmo o desejo de lhe mostrar que não fazia mais questão de vê-la, o que, no tempo em que a amava, prometia comigo mesmo testemunhar-le, quando não mais a amasse."

(Marcel Proust in: Em busca do tempo perdido vol. 4 - Sodoma e Gomorra.Tradução de Mario Quintana. Ed. Globo, p. 94)

dos caminhos

“Qual de nós pode, voltando-se no caminho onde não há regresso, dizer que o seguiu como o devia ter seguido?” 

("A obra em prosa de Fernando de Pessoa". Livro do desassossego, 1ª. Parte, Introdução e nova organização de textos de António Quadros. Publicações Europa-América, p. 200)

terça-feira, 2 de agosto de 2011

das raízes

“É horrível que não se possa arrancar o passado pela raiz. Não se pode arrancar, mas podem secar-se-lhe as raízes.”

(Tólstoi in: Anna Karenina)